Confiança aumenta, mas efeito é lento e indústria relata janeiro ruim

As medidas anunciadas neste início de ano, como aumento de impostos e “realismo tarifário” no setor elétrico, são consideradas “dolorosas”, mas contribuem para alguma melhora da confiança de empresários e representantes de associações industriais. No curto prazo, porém, não alteram o cenário para a indústria, que é de continuidade da recessão observada nos últimos seis trimestres.

Depois do tombo de 2,8% da produção em dezembro, a percepção geral é que janeiro, já um mês morno por causa da sazonalidade, foi mais fraco do que igual período de 2014, e não há perspectiva de recuperação no primeiro semestre. O aumento de juros e a necessidade de se programar para lidar com um eventual racionamento de energia e água complicam um cenário que já era ruim no ano passado, e alguns setores, como máquinas e equipamentos e material de transporte, estão demitindo.

Para os empresários, a “luz no fim do túnel”, se vier, ocorrerá somente a partir do segundo semestre, e nem mesmo a desvalorização do câmbio garante esse aumento da atividade industrial.

O presidente do grupo Fiat Crysler Automobiles (FCA) na América Latina, Cledorvino Belini, disse ao Valor que, no momento, há uma redução nas encomendas do grupo no Brasil, em relação ao ano passado. “Mas vamos lutar para ter um mercado pelo menos do mesmo tamanho do ano passado.”

Com o fim do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) reduzido para automóveis, a produção de veículos em janeiro foi 13,7% menor do que em igual mês do ano passado, divulgou ontem a Anfavea, que reúne as montadoras instaladas no país.

Segundo Belini, é “lógico” que o empresário não gosta de aumento de impostos e restrição de crédito, mas há um entendimento de que, para colocar a inflação sob controle, é necessário um momento de transição. “Conversando com outros empresários, tenho a impressão de que há uma confiança de que, em breve, o Brasil mudará as expectativas e voltará para um modelo mais otimista”, afirmou.

Segundo a Fundação Getulio Vargas (FGV), a confiança da indústria subiu 1,9% em janeiro. Ainda assim, no curto prazo, o cenário é desanimador. Fabricantes de material de construção, por exemplo, reduziram o uso de sua capacidade instalada em janeiro, indício de queda da produção. Segundo levantamento da Abramat, que reúne asempresas do setor, o nível de utilização da capacidade diminuiu de 81% em dezembro para 78% no primeiro mês do ano, abaixo da média histórica de 82%.

“Estamos entrando o ano com menos obras do que no início do ano passado, então as construtoras não estão demandando material”, diz Walter Cover, presidente da associação. Além da perda de fôlego do mercado imobiliário, Cover menciona que janeiro não deve ser um mês positivo, porque as obras de infraestrutura estão em situação mais complicada ainda devido à Operação Lava­Jato, já que cerca de metade da atividade do setor depende da cadeia de óleo e gás.

O setor de máquinas e equipamentos relata que os investimentos estão paralisados e que o segmento provavelmente teve demissões em janeiro. “O ano começou com uma série de dificuldades, como aumento da taxa de juros, de impostos e do preço da energia. O cenário é tóxico”, diz Carlos Pastoriza, presidente da Abimaq, que reúne os fabricantes do segmento.

Fornecedora de diversas cadeias, a indústria química também relata um início de ano ruim, depois de a produção ter recuado 0,6% no último trimestre de 2014 em relação ao mesmo período de 2013. “Não temos dados definitivos, mas a impressão que tivemos foi de um janeiro fraco”, conta o presidente da Abiquim, Fernando Figueiredo, para quem as medidas tomadas até agora pelo governo são necessárias, mas geram incerteza. Outra preocupação é a escassez de energia e água, afirma Figueiredo, mas, por enquanto, não houve nenhum caso de empresa que tenha interrompido a produção em função disso.

O vice­-presidente da Associação Brasileira de Papel Ondulado (ABPO), Sergio Ribas, afirma que clientes já mostram preocupação com a capacidade do setor de lidar com a possível falta de água e energia e que um eventual racionamento pode ter efeito negativo importante, especialmente sobre as pequenas e médias companhias do setor. Com os riscos crescentes para a economia neste ano, Ribas prefere não fazer projeções. Embora ainda não tenha números oficiais para janeiro, o empresário diz que observou perda de ritmo da atividade na segunda quinzena.

Luiz Cézar Rochel, gerente do departamento econômico da Abinee, de equipamentos elétricos e eletrônicos, afirma que janeiro é sazonalmente um mês parado para o setor, mas mesmo assim deve ter sido pior do que igual mês de 2014. “Não houve nenhuma melhora em relação a dezembro, nem nenhum fator positivo que tenha estimulado a retomada da atividade. Pelo contrário”, diz.

Heitor Klein, da Abicalçados, avalia que o consumo doméstico está bastante desaquecido, mas diz que parte dessa queda pode ser compensada por um quadro externo mais favorável, com desvalorização do câmbio e recuperação nos Estados Unidos. Ainda assim, diz, “será uma façanha se conseguirmos repetir o ano passado, por causa dos ajustes”.

Fernando Pimentel, diretor da Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit), trabalha com relativa estabilidade da produção em 2015 e em janeiro sobre dezembro. Devido ao quadro de incertezas elevadas, os pedidos do varejo têm sido feitos de última hora, afirma o diretor, o que prejudica o planejamento das fábricas.

Fonte: Valor Econômico

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