Escalada do dólar acelera planos de exportadoras

O ritmo surpreendente da desvalorização do real frente ao dólar colocou a exportação com mais força no radar da indústria, segundo entidades que representam o setor manufatureiro e empresas dos segmentos de bens de capital, material de transporte, calçados, móveis e papel e celulose.

Para empresas como Romi, Randon, Metalplan, Democrata e Butzke, o maior foco na exportação muitas vezes é uma forma de compensar, ao menos em parte, a possível perda de receita com o mercado interno. Quem se arrisca a dar números fala em crescimento de 10% a 15% em relação a 2014.

“Com esse câmbio o problema não é mais o preço e sim a demanda”, diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Para ele, como a demanda internacional está ainda baixa, o dólar pode beneficiar quem manteve exportação mesmo com dólar fraco.

É o caso da fabricante de bens de capital Romi. A meta da empresa é de crescimento de 10% a 15% nas exportações em 2015, na comparação com o ano passado, diz Cassiano Rosolen, presidente da empresa desde o dia 18. Em 2014, a receita operacional líquida da Romi com mercado externo cresceu 13,8% em dólares. Em moeda nacional a alta foi de 24,2%, o que melhorou o resultado consolidado. Em sentido inverso, a receita no mercado doméstico caiu 11,3% em dólares e 18,7% em reais. Com o desempenho, a fatia do mercado externo avançou de 31,3% para 43,9% da receita líquida consolidada.

Com estimativa de dólar médio a R$ 3 para este ano, Rosolen diz que os EUA são um dos mercados mais promissores, no qual a empresa investe há cerca de três anos, com produtos específicos e rede de assistência técnica. Entre os destinos importantes estão também o Reino Unido e, no mercado regional, Peru e Colômbia.

De forma semelhante ao fim de 2014, a empresa está em compasso de espera em relação à demanda doméstica para 2015. “O ano passado terminou quieto e começou quieto”, diz Rosolen, que ocupou o cargo de diretor financeiro da Romi de 2008 até o início deste mês. A empresa continua ocupando apenas 50% da sua capacidade para produção de máquinas, excluindo a atividade de fundição e fabricação de equipamentos de energia eólica.

O diretor financeiro e de relações com investidores da Randon, Geraldo Santa Catharina, diz que a maior desvalorização cambial torna a exportação estrategicamente mais importante, embora o projeto de ampliar mercado e produção em bases internacionais já exista. A empresa deve rever a taxa projetada inicialmente de dólar para o ano, “abaixo de R$ 3”.

O câmbio, diz o executivo da fabricante de implementos rodoviários, gera inflação em alguns componentes, mas dá mais competitividade para exportar. “É o mercado quem diz até quanto se paga e o câmbio ajuda a negociar.” Para o diretor, há perspectiva de elevação de demanda de mercados como o Nafta ­ bloco que reúne EUA, México e Canadá ­ e a Europa. “No Nafta, o câmbio deve favorecer a exportação de autopeças e componentes. Nosso foco também está no mercado de reposição.” A empresa também exporta para países africanos e da América do Sul.

A perspectiva para o mercado externo, diz o diretor, é mais positiva que a da demanda doméstica. “Por enquanto a expectativa para o mercado interno é desfavorável, com possibilidade de contração de PIB e dados negativos de produção de caminhões e veículos.” O mercado interno, diz, representa 82% da receita do grupo Randon.

Para José Ricardo Roriz Coelho, diretor de competitividade da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), a exportação é o caminho mais viável para quem se manteve no mercado externo. Nesse caso, diz, exportar é uma forma de neutralizar o efeito do câmbio sobre insumos dolarizados e se defender da fraca demanda doméstica. “A exportação da indústria deve ter um início de recuperação, embora nada muito expressivo ainda.” Para Roriz, a perda de mercado que o Brasil sofreu nos últimos anos em produtos de maior valor agregado é um dos desafios.

Na calçados Democrata, o maior ritmo de desvalorização do real permitirá uma política de preços “mais agressiva” para a venda da coleção de verão, a ser iniciada em junho. Marcelo Paludetto, diretor comercial, conta que a venda da coleção de inverno, realizada em março com base em dólar mais barato, permitiu corte de preços entre 3% e 5% em relação aos praticados para a estação em 2014. Com a alta do dólar, é possível avançar na redução de preços, diz, sem anunciar um percentual de corte.

“É preciso ser cauteloso porque o câmbio reflete um momento político específico, mas dá para ser mais agressivo, mesmo com a inflação nos insumos”, diz. Para Paludetto, o câmbio pode devolver nos próximos meses parte da depreciação, mas ele estima que a taxa deve ficar acima de R$ 3. “Como as vendas da nova coleção começam em junho, temos algum tempo para a precificação.”

A taxa atual, diz Paludetto, permitiu que importadores americanos voltem a procurar a calçadista na expectativa de obter produtos com preços mais competitivos. Com o quadro atual, diz, o volume de exportação pode superar o aumento de 10% este ano. Hoje, um quarto da produção da empresa vai para o exterior. As Américas representam 60% da exportação.

Michel Otte, diretor comercial da fabricante de móveis Butzke, conta que o interesse maior dos americanos ressurgiu desde o ano passado, ao mesmo tempo em que a exportação voltou a com mais força no radar. Esse interesse é um dos motivos pelo qual ele estima que a exportação avance de 30% em 2014 para 35% este ano no total da produção. Há dois anos, conta ele, os EUA representavam 25% das vendas ao exterior da companhia e agora já atingem mais da metade.

Na Metalplan também há a percepção de que o câmbio já possibilita negociações para exportação que antes seriam descartadas logo no início. “A ideia é aproveitar o momento como oportunidade para conseguir mais mercado”, diz Edgard Dutra, diretor da fabricante de bens de capital.

Dutra conta que a empresa tem acompanhado o movimento do câmbio, que pode fazer diferença nas novas listas de preço da empresa. Ele pondera, porém, que a empresa tem investido em produtos novos para ganhar mercado também internamente. Segundo ele, a expectativa é que a evolução do dólar permita manter o processo de substituição de importações já iniciado e que a receita com exportação cresça 15%. No ano passado, o faturamento da Metalplan caiu 20% em relação a 2013 e o plano de Dutra para este ano é crescer de 10% a 15% sobre 2014.

Na divulgação dos balanços anuais, o mercado externo foi ponto de destaque para a fabricante de máquinas WEG. Harry Schmelzer Junior, presidente da empresa, disse que os planos envolvem expansão da fatia do mercado externo nos negócios da companhia para 60% em cinco anos. O executivo diz que o dólar mais alto eleva a competitividade para exportar, mas diz também que há pressão sobre custos, como aço e cobre.

A principal vantagem de um patamar mais elevado da moeda americana, diz Schmelzer, é o efeito nos clientes. “Eu fico mais competitivo , mas torço muito mais para que os clientes da WEG fiquem mais competitivos.” (Colaborou Victória Mantoan, de São Paulo)

 

Fonte: Valor Econômico

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